Junção administrativa de cidades quebradas pode resolver a falência dos pequenos municípios
No auge da crise da zona do euro, pelo menos dois dos países mais
encrencados, Portugal e Itália, analisaram a possibilidade de enxugar a
estrutura administrativa por meio da fusão de municípios muito pequenos. Se em
Portugal a ideia não chegou a ser colocada em prática, na Itália o processo
segue em curso, com diversas fusões já ocorridas e outras programadas para
entrar em vigor até 2020, normalmente envolvendo cidades que hoje têm algumas
centenas de habitantes.
No Brasil, se até
mesmo os grandes municípios já sofrem com a crise no setor público, o que dizer
dos pequenos, ainda mais vulneráveis? Um estudo do Tribunal de Contas do Estado
do Paraná (TCE) sugere que a fusão, assim como na Europa, poderia ser uma saída
para pequenos municípios cuja viabilidade financeira é, na melhor das
hipóteses, questionável. O relatório cita 95 cidades (das 399 que existem no
Paraná) que têm menos de 5 mil habitantes e poderiam se beneficiar de uma união
– o número é um pouco maior que os 76 municípios instituídos no estado desde a
Constituição de 1988.
Há casos em que o desmembramento se justifica, especialmente no caso de
pequenos distritos que abrigavam atividades geradoras de renda, mas nunca
recebiam um retorno proporcional por parte da sede. Mas, em muitas outras
situações, a criação de um município ocorria por mero interesse politiqueiro,
conveniente a líderes políticos locais e a qualquer um que desejasse se
pendurar na estrutura administrativa. A mesma população, gerando a mesma
quantidade de riqueza, passou a bancar mais algumas dezenas de prefeitos,
centenas de vereadores e secretários municipais, milhares de assessores e assim
sucessivamente.
Some-se a isso nosso federalismo de mentirinha, que concentra em
Brasília regulações e recursos. Municípios não podem legislar sobre diversos
assuntos que lhe dizem respeito porque é infinita a lista de temas que são de
competência federal, impedindo a adoção de soluções inteligentes adequadas à
realidade local. E a estrutura tributária nacional concentra os recursos na
União, em vez de manter o dinheiro dos tributos nas unidades administrativas
mais próximas do cidadão. Como resultado, municípios e estados precisam dos
Fundos de Participação (o FPE, para estados, e o FPM, para municípios) e outros
repasses para fechar suas contas – quando elas fecham. Uma situação de
dependência muito conveniente ao poder central, que além de concentrar os
recursos ainda empurra cada vez mais responsabilidades para os municípios.
Refazer totalmente
o pacto federativo, com mais autonomia para os municípios e a correspondente
fatia do bolo fiscal, seria uma grande ajuda para as pequenas cidades; trata-se
de algo urgente, embora altamente improvável. Mesmo assim, restaria o problema
daqueles municípios que foram criados por mero interesse político, sem a menor
preocupação com sua viabilidade econômica e que dificilmente se manteriam em pé
sem ajudas ou repasses, prejudicando a população, especialmente a mais pobre,
que depende da rede pública de saúde e educação, entre outros serviços.
Uma saída é o
estabelecimento de consórcios, em que cidades próximas estabelecem parcerias
para oferecer de forma unificada serviços em áreas como saúde e coleta de lixo,
oferecendo ganhos de escala e proporcionando economia ao setor público. Mas a
fusão pura e simples não pode ser descartada e é uma possibilidade que merece
estudo sério, por mais que políticos interessados na manutenção de pequenos
currais eleitorais tentem torpedear a ideia no nascedouro. Os dados do TCE
merecem um exame mais atento, e talvez os resultados da experiência italiana,
quando houver dados consolidados, também ajudem a apontar o melhor caminho a
seguir.
Fonte: Gazeta do Povo
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